domingo, 28 de fevereiro de 2010

Magistério do RJ: Não há escolha possível

Abro este espaço de opinião para a colega de Sociologia Urbana da UERJ, Victoria Tomaz. Ela foi aprovada em concurso para o magistério estadual do Rio e conta a saga para ocupar o cargo.

Não há escolha possível

Sou formada em Ciências Sociais pela UERJ e, em 2008, prestei concurso para
o Magistério do Estado tendo sido aprovada em 25 º para a disciplina de Sociologia.

Em Janeiro deste ano recebi um telegrama solicitando meu comparecimento à Coordenadoria Regional Metropolitana X munida de todos os documentos para o processo de admissão, condicionado a prévia aprovação pela perícia médica.

Confesso que relutei em comemorar e até mesmo em aceitar, não só por conta da baixa remuneração (R$ 600,00) como, também, pelo conhecimento da situação atual do magistério no estado do Rio de Janeiro. Ponderei com familiares e amigos mais próximos se deveria aceitar e acabei me rendendo aos argumentos do que me diziam: "aceita, afinal é uma oportunidade! Veja como é, já que passou, agora não custa nada tentar".

Custa. E caro. Os exames admissionais são de responsabilidade do candidato, isto é, você paga inscrição, faz a prova, é aprovado, é convocado por telegrama e arca com todas as despesas dos exames médicos admissionais que não são poucos: sangue, urina, laudo de oftalmologista e laudo de otorrino com uma videolaringoscopia.

Exames pagos e realizados. Tudo certo, apesar de continuar míope, já podia mostrar para amigos minha garganta em DVD.

Próximo passo: Perícia médica.

Fui até o centro da cidade realizar a perícia quando, após enfrentar uma de umas quarenta pessoas, aguardar ser chamada por uma hora e reclamar da demora, fui atendida por um médico que fez uma leitura dinâmica dos laudos em 20 segundos, perguntou se eu estava com pneumonia (?) e disse: "Ok, pode chamar o próximo, por favor".

Com a aprovação do médico biônico em mãos, restava-me aguardar o dia da apresentação para escolha da escola na qual iria trabalhar.

Dia 24/02 ,às 09:40h, cheguei na Metropolitana X para a escolha da escola, agendada para as 10:00h. Enquanto esperava conversando com os colegas de profissão, sobre os percalços para a realização dos exames médicos, um senhor da recepção informou que poderíamos subir que o procedimento de escolha teria início.

Subimos, sentamos, esperamos. Mais de duas horas.

Quase três horas depois, alguns professores que haviam feito a escolha no dia anterior começaram a retornar, relatando casos alarmantes: "cheguei na escola e não tinha vaga pra mim"; "a diretora informou que faltava professor de Geografia, eu sou de História, mas ela me disse que se eu quisesse eu podia dar aula de Geografia"; "não posso dar aula em quatro escolas diferentes, pagarei de passagem de ônibus o que receberei de salário".

A sensação de que estava numa "fria" crescia na mesma proporção absurda dos relatos.

Às 14h fui chamada para fazer a minha escolha. Minha não, a escolha que a funcionária tinha para mim: "Só tem vaga de 12 tempos na Tijuca na escola Antonio Prado Junior, você vai querer essa ou vai querer ficar procurando vagas pingadas em outras escolas piores professora?"

"Eu queria saber se tem horário para mim em uma escola próxima da minha casa, você pode verificar?"

"Claro, mas acho difícil que a diretora atenda o celular essa hora e só ela pode dar essa informação".

Como é que é? Só uma pessoa sabe dizer se uma escola com centenas de alunos tem vaga para professor? Não há uma secretaria? Um funcionário da escola bem informado? Vocês da coordenadoria regional de educação não sabem? O que estou fazendo aqui então?

Realmente eles não sabiam, descobri isto da pior forma.

Aceitei a escola "que tinha vaga na Tijuca" e fui até lá me apresentar. A diretora me recebeu rindo e lembrando Newton, me explicou que era uma questão de Física "não posso ter quatro professores dando aula na mesma sala, para a mesma turma, no mesmo horário. Você é a quarta pessoa que a Metro X envia hoje para assumir Sociologia aqui, não tenho vagas".

Aquilo não era mais uma "fria", passava a ser falta de consideração, falta de respeito, falta de ética, de profissionalismo, ausência de tudo que se poderia querer (e exigir) naquele momento.

Retornei a Metropolitana X, expliquei o ocorrido ouvindo em seguida que teria de esperar para escolher outra escola.

Esperar. De novo. Eram quase 17h e eu não havia nem sequer almoçado.

Pedi respeito, exigi uma retratação pelo que havia ocorrido, esperei de pé, em frente a mesa da funcionária que incomodada com a situação e com minha presença procurou outras escolas no sistema para me "encaixar".

Durante a procura outras funcionárias reclamavam da minha postura, diziam que eu estava tomando tempo demais e que era para eu "escolher o que tinha e depois me virar, porque na realidade tudo mudava na escola".

Escolhi os tempos e as escolas. Me dividi em duas, quatro dias e sete turmas de 40 alunos cada. Não sei se efetivamente poderei ministrar aulas nesses tempos, só após uma conversa pessoal com a diretora de uma das escolas saberei. Não sei se darei conta de tantos alunos, nem mesmo se conseguirei conciliar os horários de estudo com os horários picados de aulas.

O que sei é que todo o ocorrido neste relato, somado a falta de perspectiva dos professores que já atuam no magistério, só aumentaram a minha descrença na gestão da Educação no Estado do Rio de Janeiro.

Sei também que meu problema nem é tão grande perto do de alguns professores de Espanhol que às 18:40h receberam a notícia de que não havia vagas para alocar nenhum deles e que eles seriam "devolvidos" para que a Secretaria de Educação, responsável pela convocação, decidisse o destino desses professores que estudaram quatro anos em uma Universidade, que foram aprovados em um concurso, que fizeram exames caros, que esperaram horas por atendimento naquele dia e que iam embora, como eu, sem solução e literalmente, sem escolha.

O que falar dos alunos que tiveram aulas iniciadas no inicio de Fevereiro e até hoje estão (e quem sabe ficarão) sem professores para ministrar aulas?

O ocorrido ontem na Metropolitana X, reflete a atual situação da Educação no Estado do Rio de Janeiro, descaso total e absoluto com professores e alunos. Que cidadão são desejará ser professor do Estado nessas condições?

Se o início, até então incerto, se deu da forma que ocorreu comigo, o final eu já sei: a escolha pelo magistério no Estado do Rio de Janeiro não é difícil. É impossível!

Victoria R. Tomaz